quinta-feira, março 29, 2007

primavera


Quantas são as folhas que vão nascer agora, quantos são os galhos que deixarão sua nudez e magreza para uma nova forma e cor? Quantos novos cheiros invadirão nossos sentidos e poros? Quantos graus de raios solares entrarão nas nossas janelas e iluminarão as nossas tardes?

E quanto a mim? De onde virão as minhas flores? Serão elas tão coloridas quanto a primavera ou serão tão verdes quanto a clorofila? Será mesmo um ciclo? Não vão elas daqui mais alguns meses cair e me deixar completamente nua novamente? Provavelmente que sim...
Tomara que eu consiga pelo menos manter as raízes em pé para que na próxima primavera as flores nasçam cada vez mais coloridas e os frutos possam amuderecer e cair no chão, sem que ninguém os arranque precipitadamente.

Que venha a PRIMAVERA!!!!!

terça-feira, março 13, 2007

Cronica da casa assassinada - Lucio Cardoso


"Por mais que viva, jamais poderei esquecer a sensacao transmitida pela forma dos seus seios entre minhas maos, da garganta macia onde meus labios passeavam, do perfume quente, adocicado, que se desprendia dela, como de um canteiro de violetas machucadas. Ah, e nem posso diozer que nao tremesse e nao suasse ante a extensao do meu pecado, pois repetindo mil e mil vezes que afagava e mordia a carne que me concebera, ao mesmo tempo encnotrava nisto um prazer estranho e mortal, e era como se debrucasse sobre mim mesmo, e tendo sido o mais solitario dos seres, agora me desfizesse sobre um enredado de perfume e de nervos que era eu mesmo, minha imagem mais fiel, minha consciencia e meu inferno.
Docemente escorreguei a mao ao longo do seu tronco, sentindo encrespar-se a macieza de sua pele - e como se fosse um caminho sabido de ha muito, e ali devese desaguar, unidas, as dissonancias do mundo, coloquei-a sobre seu sexo, que palpitou a esse contato como uma ventosa de la. Ela estremeceu, ondulou como a chegada de um espasmo - e sob meus dedos que se faziam mais duros, e mais precisos no seu afago, senti abrir-se aquela flor oculta, e desnudar-se o misterio de sua natureza, exposta e franca, como uma boca que dissesse, nao o seu nome, mas o nome do seu convite. Subia mao, voltei a afagar-lhe o talhe, dobrei-a, venci-a ao poder do meu carinho - e afinal como um grito rompeu-se o encanto e entreabriu-se a fenda escura e vermelha daquele corpo, num riso tao moco e tao vibratil que atraves dele parecia ressoar toda a musica existente.
Dizer que a amei, sera dizer pouco; deixando-me absorver, tentei absorve-la e dessa fusao retirei minha primeira nocao do amor, do seu abismo. Quantas vezes a amei, sera dificil dizer, tanto misturei o ama-la com o transporte que me comovia. Incentivava-me o ser sacrilego, imaginando uma afronta as leis humanas e divinas, deliciava-me em estreita-la contra mim, em machucar-lhe os seios, em morde-los, reiventando o gosto de ser crianca, e imaginando a vida estreita e funda, hoje minha, que independente de mim, a este mundo me havia conduzido.
Eu, nos mesmos, que outro delirio maior do que o dessas carnes sofregas que se uniam, e criavam temporadas extras em seus desvios de amor?"

Lucio Cardoso, in Cronica da Casa assassinada